domingo, 3 de agosto de 2008

Capítulo Primeiro: Chegada

Londres, 3 de maio de 1408

Helena acordou sem abrir os olhos. Falou baixo para si mesma:

- Maravilha... menos um número no celular, e mais uma ressaca, e mais uma reclamação por eu ter dormido na mesa...

Alguns gritos, ela já esperava, então nem se deu ao trabalho de olhar. Mas algo estava errado. Aqueles gritos não pareciam ser inglês ... Alias, eram em inglês, mas um que era terrivelmente fora de época. Já não se usava mais o "Thou" , e nem se usava aquela fala rebuscada e formal... E por algum motivo , estavam a chamando de "My lady".

Levantou o rosto , e teve aquela incômoda sensação de ser o centro das atenções. Estava em uma taverna, parecia vagamente familiar ao lugar que adormeceu...Tirando os animais pendurados e o chão coberto de palha, e a ausência de qualquer coisa que lembrasse o século XXI.

A pessoa que a estava chamando, era um homem baixo, com uma cicatriz no pescoço e uma cota de malha muito enferrujada. Ele deu um sorriso malicioso e falou :

-"My Lady" , uma dama como você não deveria estar vestida assim! Deve estar com frio! Posso aquece-la um pouco em minha humilde casa?


Helena não sabia que peça estavam lhe pregando, mas era uma muito boa. Os mal-encarados eram perfeitos, e até a limpeza do local era o que ela esperava de uma taverna. Pensou no que o sujeito disse, e reparou que estava com um vestido bem revelador (que as amigas chamavam de "El matador" pelo efeito obvio na população masculina). Uma segunda observação foi de que não haviam mulheres ali com qualquer roupa mais provocante do que uma veste episcopal. A terceira foi que os atores sabiam simular desconcertantemente bem a atitude de um lobo vendo uma presa indefesa...e ela não tinha duvida de que era a ovelha da vez. Uma quarta observação foi interrompida quando o homem baixo a levantou e começou a carrega-la em direção a porta.
Sua quinta observação foi gritar:

-Socorro !!! Assedio!! Policia!! Socorro!!!

Por mais que esperneasse ou gritasse, ele não a deixava ir, muito menos alguém a ajudou. Pareciam todos agir como se fosse algo normal. Ela achou que a brincadeira foi longa demais, e tentou um ultimo recurso:

-Chega!! Eu sei que é uma piada, podem parar de atuar, se continuarem eu vou processar o programa!!

Nisso o homem a abaixou e sorriu novamente. Nessa hora ela reparou nos detalhes impressionantes da roupa, do figurino, a sujeira , até a dentição era o que se esperava de um quase-viking...

Assim, como um mergulho em água fria, ela repentinamente tomou consciência. Aquilo não era encenação, de alguma forma, ela veio parar em uma taverna que ficou seis séculos travada no tempo? Não, não é possível...viagem no tempo é coisa para Tachyons e ficção cientifica... Ela só bebeu um pouquinho a mais , não era possível! Suas reflexões sobre a natureza do universo foram interrompidas quando mais uma vez estava sendo levada à a porta. Parecia tudo perdido , não conseguia fazer absolutamente nada que tivesse efeito, até pensou em chorar, mas o orgulho de mulher moderna não se curva nem ao tempo, então deixou de lado, se contentando em falar e espernear (Ainda não convencida que era de verdade)

Subitamente, uma figura adentra o lugar. Ela não consegue ver muito bem, mas percebe que é um homem alto, usando guantes (amadura para as mãos e antebraços) , mas estranhamente, sem nenhuma outra peça de aço. Apenas um colar, em forma de dragão, feito de ouro. Ela não ouviu o que o recém chegado falou, afinal, ainda estava se acostumando ao inglês pré-gramática, as palavras que reconheceu foram : Quem, não, e lá fora, outra ela não compreendeu mas era com certeza um insulto (essas palavras são sempre reconhecíveis, em qualquer língua).

Quando ela se deu conta, estava já no exterior do restaurante, olhando o que deveria ser Londres, mas Londres tinha prédios, asfalto e serviços de limpeza urbana, os três evidentemente não existiam ali, aliás, o lugar parecia inalterado pela revolução industrial, ou até pelo renascimento italiano.

O baixinho da cicatriz largou-a no chão e ela finalmente pode observar o estranho. Era alto, aproximadamente um metro e oitenta, cabelos negros, olhos mais negros ainda, e uma aparência um pouco ameaçadora. Algo em seu olhar parecia queimar como um fogo infernal. Algo em sua cabeça o chamou de "Dante"

Não foram trocadas palavras. O homem que a agarrou saiu correndo como um louco, avançando para cima do estranho, girando os braços para golpeá-lo. "Dante" se esquivou como se estivesse entediado por um palhaço particularmente sem-graça . Sem mudar de expressão, deu um soco no ventre do inimigo, seguido por uma cotovelada que encerrou a luta.

Ela não sabia o nome de verdade dele. Não sabia onde, em que ano, ou em que planeta ela estava.

Ela não tinha entendido muitas palavras até agora, mas sabia que tinha sido salva

E pela primeira vez na vida, um homem a ajudou... Parecia bom demais para ser verdade... O mais inverossímil de tudo era alguém ter feito algo por ela... Isso que não dava para acreditar...

Olhou nos olhos do estranho , e sentiu um arrepio que não tinha nada a ver com o frio.

Londres, 3 de maio de 1408


Um comentário:

Lívia de Araújo disse...

Muito legal!
Isso é um capítulo de um livro ou você está escrevendo uma história?

Quando vc vai postar o próximo capítulo???
Tô Curiosa XDDD